19 de abr. de 2016

Será que o líder da Hungria desistiu da Europa?

                       


Foreign Policy, 18 de abril de 2016.



Por Atilla Mong



Quando se trata de bater em Bruxelas, ninguém supera Viktor Orban. 

Ao longo das próximas semanas, os líderes europeus estarão concentrando sua atenção sobre o Reino Unido, cujos cidadãos em breve vão decidir se querem que o país continue a fazer parte da União Europeia (Brexit). Mas essa não é a única ameaça para a composição da União Europeia atualmente, mas estará em um futuro próximo. O problema também está se formando em Budapeste. 

O primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orban, é um Eurocético desde muito tempo. Desde que assumiu o cargo em 2010, tem sido claro que não há nenhum amor perdido entre ele e Bruxelas. Ele aproveita praticamente todas as oportunidades que tem para repreender os líderes da União Europeia – e eles parecem cada vez mais dispostos a retribuir o favor.

Mas, ultimamente, Orban tem abordado assuntos de um nível totalmente diferente, o que levou os partidos de oposição a avisarem que ele está tramando tirar a Hungria da União Europeia por completo. E, embora a sua posição sobre a questão não estar clara, há muitos sinais de que ele está ansioso para rever o status da Hungria no seio da União Europeia. 


Nem sempre foi assim. Orban já foi um fervoroso pró-europeu. Na verdade, foi ele quem conduziu as negociações de adesão de seu país à União Europeia durante o seu primeiro mandato, entre 1998 a 2002. Mas uma vez ele voltou para a oposição nos anos que se seguiram, e sua atitude começou a mudar. 

Ele viu uma oportunidade de responder aos crescentes sentimentos antiglobalização e anti-União Europeia da média dos húngaros, muitos dos quais sentem que a adesão à União Europeia não trouxe a prosperidade que lhes foi prometido. 

No momento em que Orban voltou ao poder em 2010, fê-lo em uma plataforma com uma agenda forte antiglobalização e anti-Bruxelas. Desde então, ele exibia regularmente seu desprezo pelos valores europeus. Ele aprovou acentuadamente leis que restringem e cerceiam a liberdade dos meios de comunicação independentes, e permitiu a tributação extra de empresas da União Europeia que operam na Hungria. Ele declarou abertamente que visa transformar a Hungria em uma “democracia iliberal”, citando a Turquia, Rússia e China como modelos louváveis. 

Ele tem usado a crise migrante para elevar-se ao nível da União Europeia em proeminência como um líder dos radicais que pretendem construir cercas para defender “A fortaleza Europeia” – a implicação é que isso é algo com que Bruxelas não pode lidar. E apesar de seu partido de “extrema-direita” Fidesz ainda pertencer ao Partido Popular Europeu – a aliança conservadora dominante no Parlamento Europeu – com o qual ele está se tornando claramente menos suscetível, até mesmo para  com os seus aliados de longa data, como os democratas cristãos da Chanceler alemã Ângela Merkel. 

Alguns dos recentes comentários de Orban têm alimentado adicionalmente a ansiedade sobre suas intenções. Ultimamente ele e os principais membros de seu partido têm descrito a adesão da Hungria à União Europeia como “uma mera questão de negócios” – um sinal vermelho para os líderes europeus, que veem a União Europeia, acima de tudo, como um projeto político vital. Em uma recente entrevista, Janos Lazar, um ministro muitas vezes visto como sucessor de Orban, também deu a entender que a adesão da Hungria à União Europeia tinha por objetivo uma questão meramente econômica. Esta é uma provocação calculada. 

Se a União Europeia é apenas uma questão de negócios, então não há nenhuma razão para aceitar uma política comum Europeia sobre a crise de refugiados – e o contingente de refugiados que vem com ele. 

Escusado será dizer que, a crise tem dado adendos eficazes às argumentações Anti-União Europeia de Orban. Em uma de suas recentes entrevistas de rádio, ele declarou que a Europa não é mais um lugar seguro para os seus colegas húngaros, alegando que a posição da União Europeia sobre os imigrantes levou a “confusão imigrante”, “campos de refugiados que estão sendo incendiados” e “gangues predando mulheres húngaras, e nossas mulheres e filhas”. 

Esses comentários foram feitos apenas alguns dias depois de 01 de março, um discurso do Estado da nação, em que o primeiro-ministro Orban reformula o debate sobre a política de imigração como uma batalha épica entre a “Europa das nações livres” (apoiadoras da soberania nacional, incluindo a Hungria) e os federalistas que se encontram em Berlim, Bruxelas e Paris. No mais recente, ele acredita que as quotas de imigrantes irá transformar a Europa numa espécie de califado, um ataque direto aos valores cristãos do continente. Um partido de oposição de esquerda acusou imediatamente Orban de preparar o terreno para “tirar a Hungria da União Europeia”, também se referindo aos planos de Orban para convocar um referendo sobre as quotas de refugiados da União Europeia no final deste ano. Essa iniciativa é claramente destinada a fornecer ao primeiro-ministro um mandato popular em sua luta contra Bruxelas. 


Embora tal referendo descaradamente viole as regras da União Europeia, é uma maneira perfeita para Orban para impulsionar a posição de seu partido contra o seu principal rival, o partido de “extrema-direita” Jobbik. (A próxima eleição não deverá acontecer na Hungria até 2018).

Portanto, é certamente verdade que Orban tem razões eminentemente práticas para ceder ao populismo anti-União Europeia. 

No entanto, sua cruzada anti-Bruxelas não pode ser descartada como puro oportunismo, ou seja – há também um elemento ideológico forte. Basta considerar sua afinidade com Vladimir Putin. Levar a Hungria para mais perto de Moscou parece ter se tornado a peça central da política externa de Orban. No ano passado, Moscou concedeu a Budapeste um empréstimo de 10 bilhões de euros. Ostensivamente era para a expansão duma única usina de energia nuclear da Hungria, mas alguns observadores veem o negócio como parte dum esforço mais amplo do Kremlin para comprar influência dos húngaros. 

Enquanto isso, a fala de Orban sobre democracia iliberal é muito mais passível de Moscou do que de Bruxelas. Quando se trata de valores e linguagem corporal, o primeiro-ministro húngaro parece muito mais à vontade com Putin do que com qualquer um em Bruxelas. Durante a última visita de Orban à Moscou, Putin e a mídia russa o elogiaram por sua postura crítica em relação à União Europeia, e o presidente russo alegou estar tão preocupado com a “defesa da identidade europeia”, quanto o próprio Orban. A abordagem de Orban pode, de fato, ser resumida como uma espécie de “Europutinismo”: capitalismo de compadrio com economia, e semi-autoritarismo na política. 

Uma vez que o membro mais liberal do bloco soviético, a Hungria está mais uma vez outlier -, mas desta vez com a União Europeia. 

Desse modo tudo isso significa que Orban está realmente manobrando para uma saída? Provavelmente não. Tirar a Hungria por completo seria quase que certamente revelar-se como extremamente impopular entre os eleitores. O que Orban parece querer é mais espaço entre Budapeste e Bruxelas. Ele está claramente disposto a resistir a uma maior integração a política econômica entre os atuais membros da União Europeia. A julgar por suas ações até o momento, ele parece vislumbrar um futuro para a Hungria nas bordas da União Europeia, como uma espécie de ponte entre o Oriente e o Ocidente, ainda desfrutando de alguns benefícios da adesão à União Europeia ao mesmo tempo em que procura crescer mais próximo da Rússia. É claro que, só quando ele souber resolver essa equação. 


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